A condição de ser mulher me privou de um hábito que cultivava de conversar com motoristas de taxi (ou aplicativos). Hoje em dia evito porque realmente não tá fácil – já foi? – , mas de vez em quando a gente entra no flow, principalmente quando o condutor é um senhor de idade, que começa o assunto ressaltando a importância dos velhos se manterem hidratados no verão, ponto que não posso discordar, dado que tive uma avó que viveu até os cem anos e uma das dificuldades era fazê-la beber água.
O motorista se interessou, emocionado virou para trás exclamando: cem anos, que beleza! Aposto que ela era uma pessoa incrível, de bem com a vida e bem humorada.
Risos do lado de cá.
Minha avó centenária era uma portuguesa da Régua (região ali do Porto) e veio para o Brasil já adulta. Viveu 60 anos aqui e nunca deixou de desfiar sua ladainha. Maldizia o dia em que casou com meu avô e veio dar cá, nessa desgraça. Convivi com isso durante vinte e nove anos e afirmo com tranquilidade que nunca vi a velha de bom humor.
Voltando ao motorista, que continuava entusiasmado: e digo mais, é impossível uma pessoa ranzinza chegar nessa idade, afimava com convicção. Uma pessoa que reclama quando chove, reclama quando está calor, reclama porque trabalha muito, não chega nem aos setenta!
Nessa hora me preocupei, o homem estava a me descrever ali todinha. O fruto não cai longe da árvore, como sabemos. Pois bem, pensei comigo, depois do tarólogo gen z que previu que eu morreria bem velha aos sessenta, temos aqui a segunda sentença, a prova de que não duro mais que uns vinte, trinta anos no máximo.
Não contei nada disso a ele, que parecia muito certo de sua teoria e compartilhava comigo seus segredos de vida: não encaro taxi um trabalho, digo a mim mesmo que vou passear.
Não acreditei, evidentemente, mas mantive pra mim minhas suspeitas.
Nos despedimos em clima saudosista – bons tempos das cooperativas, Tele Urca, JB Taxi – e fui pra casa temendo nem acordar no dia seguinte.
Esse é o clássico feliz-da-vida que a mulher que faz tudo pra ele e deve bufar de sobrecarregada haha. Eta vida gostosa.